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Cinco em quatro, e o resto?
A opinião de Luís Miguel Ribeiro no Dinheiro Vivo

"Não coloco em causa a bondade desta experiência-piloto, à semelhança do que tem sucedido noutros países, na medida em que se está perante uma alteração profunda na forma como a economia e a sociedade estão organizadas. O que questiono, isso sim, é o momento, neste pós-pandemia e com um cenário de guerra na Europa. Não é, de todo, oportuno!  

O presidente da AEP, Luís Miguel Ribeiro, dedica a sua mais recente coluna de opinião no Dinheiro Vivo à análise da intenção do Governo de avançar, já a partir de junho de 2023, com a experiência-piloto da semana de trabalho de quatro dias, sem corte de salário.

Leia a coluna:

Cinco em quatro, e o resto?

Num contexto em que as empresas enfrentam um forte agravamento dos custos de produção e de financiamento, face à espiral inflacionista, o Governo quer avançar, já a partir de junho de 2023, com a experiência-piloto da semana de trabalho de quatro dias, sem corte de salário. 

A ideia é que seja aplicada, de forma voluntária e reversível, apenas ao setor privado, com o objetivo de avaliar os impactos nas empresas, nos trabalhadores e nas suas famílias.

Não coloco em causa a bondade desta experiência-piloto, à semelhança do que tem sucedido noutros países, na medida em que se está perante uma alteração profunda na forma como a economia e a sociedade estão organizadas.

O que questiono, isso sim, é o momento, neste pós-pandemia e com um cenário de guerra na Europa. Não é, de todo, oportuno!

A mudança implica custos para as empresas, atendendo a que a remuneração por hora trabalhada será mais elevada e não será acompanhada por um acréscimo de produtividade que compense esse esforço suportado inteiramente pelas empresas. Ou haverá evidência suficiente de que em quatro dias podemos produzir o mesmo que em cinco?

Entre os principais objetivos da redução da semana de trabalho está a promoção de um maior equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, o que será positivo do ponto de vista da melhoria da qualidade de vida das pessoas. Contudo, essa melhoria também está estreitamente ligada ao seu rendimento e, em termos agregados, ao nível de rendimento da economia. 

Neste momento, o foco da discussão e das preocupações deve ser a recuperação da economia portuguesa, por forma a inverter a trajetória de empobrecimento relativo. Intimamente ligadas ao crescimento económico está, entre tantas outras, a questão da valorização da indústria e das qualificações, correlacionadas com o alcance de maiores níveis de produtividade. Estes temas e a sua resolução devem estar nas preocupações do momento, a par de medidas de mitigação dos impactos da atual conjuntura extremamente adversa.

Importa analisar, com seriedade, todos os impactos potencialmente positivos e negativos e fazer um benchmarking internacional, mas sem ignorar a necessária prudência na “importação” de modelos que possam estar a funcionar bem em países com culturas muito diferentes e, também, com níveis de desenvolvimento económico muito diferentes e superiores ao nosso.

Luís Miguel Ribeiro, presidente da Associação Empresarial de Portugal
In Dinheiro Vivo 12.11.2022